A recusa das imagens evidentes
I
Rosa que só tens nexo
Fora da tua imagem:
Aqui és só reflexo
Do universo unido
No instante florido
Que ofereces aos que te olham,
Sem te ver, de passagem.
II
Girassol que na retina
Da planície se dissolve.
És a cor mais repentina
Da aragem que te envolve.
Girassol que só te viras
Ao que não te fica perto
E só giras porque giras
Sobre o teu eixo secreto.
.
Girassol que sem volume
Volume que sem contorno
No despegar-se resume
Só a pressa do retorno.
III
É um outono que não é outono.
Tampouco a estação por que se espera
Na dor de nos deixarern ao abandono
As ninfas que são flores na primavera.
.
No entanto nas coisas o segredo
De uma só alma põe a sabedoria
Dando à terra repouso no arvoredo
De que o cedro é a sagrada biografia.
IV
Há noites que são feitas dos rneus braços
E um silêncio comum às violetas.
E há sete luas que são sete traços
De sete noites que nunca forarn feitas.
Há noites que levarnos à cintura
Como um cinto de grandes borboletas.
E um risco a sangue na nossa carne escura
Duma espada à bainha dum cometa.
Há noites que nos deixam para trás
Enrolados no nosso desencanto
E cisnes brancos que só são iguais
A mais longínqua onda do seu canto.
Há noites que nos levam para onde
O fantasma de nos fica mais perto;
E é sempre a nossa voz que nos responde
E só o nosso nome estava certo.
Há noites que são lírios e são feras
E a nossa exactidão de rosa vil
Reconcilia no frio das esferas
Os astros que se olham de perfil.
V
Há um cipreste que se dissimula
No dia que nos leva pela mão.
E entre brasas de sol que ardem na rua
Uma pomba que faz de coração.
.
Voa: uma linha recta para a lua
Em sonhos que nos levam de balão.
Perversidade de uma paz futura
Onde só chegaremos de caixão?
E nada nos recorda esse futuro
Escondido atrás das nuvens que trouxeram
Ao nosso rosto os olhos prematuros
Das órbitas reais que nos esperam.
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