Apago cigarro após cigarro,
a chávena ainda quente do café,
e o corpo todo à escuta.
No sono entrevi o teu olhar e
ao visitar-te, excessivamente te beijei.
Entre temor, entre comas, os lugares
que habito são apenas pontos
de esquecimento e fuga.
Tenho medo, por vezes, de estar em casa,
outras, de sair, não sei o que me persegue
ou persigo, movo-me apenas
por entre odores, escombros, e aflita
com perigos indefiníveis.
Os dias todos assim, & etc., 1996, pág. 30
Anda de salto alto, meia preta,
o coração ao pé da boca e,
mais que tudo isso, ver passar
ao pé da porta
uma figura como esta.
Os dias todos assim, & etc., 1996, pág. 83
Tenho a vida feita num novelo,
não pertenço a lado nenhum,
não tenho
país ou terra, nenhuma raiz,
nem escolhas ou nome,
nada a dizer, nada a calar,
nem harmonias ou crenças
nem desígnios.
Uma linha apenas
num mar de mós
sem moinhos.
Os dias todos assim, & etc., 1996, pág. 85
Soa por vezes bem dizer certas palavras
em francês. Foi ontem o caso de
"le résumé" que escrevi num fax
enviado ao Thierry, um rapaz bonito
que vive em Paris e em casa não tem
T.V.
Tem no currículo um éme bi ei.
Os dias todos assim, & etc., 1996, pág. 89
A tua voz ao telefone
entre um fax,
o correio electrónico
e outras banalidades,
a tua voz,
é o único sinal
de deslumbramento
nesta tarde.
Os dias todos assim, & etc., 1996, pág. 92
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