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sábado, 11 de abril de 2009

António Feliciano de Castilho

A TOMADA DE COIMBRA


(Xácara)


I


Caminhavam frades bentos
do mosteiro de Lorvão,
quando acharam Dom Fernando
no meio de Carrião:
era Dom Fernando o Rei,
e seu reino era Leão.


– D. Fernando, D. Fernando,
novas de consolação!
cavaleiros não nos oiçam;
manda sair quantos são.
Deus te nos manda dizer
que tens Coimbra na mão.


«Descuidados estão Moiros
do poderio cristão;
deles o havemos sabido
por sua conversação,
quando nos vêm de Coimbra
a montear em Lorvão.


«Fingimos uma romagem
por livrar de suspeição,
e viemos dar-te aviso,
grão Rei, senhor de Leão.
Manda logo fazer prestes
todo o ginete e peão.


Como três meses passaram,
era por Janeiro então,
el-Rei é sobre Coimbra,
e os de dentro em confusão;
mas vale o muro à cidade,
que é mui boa defensão.


Em que traz muitos vassalos
de caldeira e de pendão,
em que traz o Cid Rui Dias,
mais forte que quantos são,
não acaba de a tomar,
sete meses já lá vão.


..........................


Cristãos, ganhastes Coimbra,
mais que jóia oriental;
mais tu, Coimbra, ganhaste,
que tens fonte baptismal,
e a tua mesquita grande
verás logo em catedral.


Dar meia cidade aos monges
queria o Rei liberal,
mas os monges só quiseram
uma casa monacal,
contentes com Lorvão santo,
seu paraíso terreal.


Foi-se el-Rei a Compostela
com sua gente leal.
De atabales e trombetas
soa estrondo festival;
abrem-se as portas do templo
bem armado e triunfal.


Todos co'o joelho em terra
como cumpre em caso tal,
diziam de agradecidos
ao valedor imortal:
– «Santiago, Santiago,
salvaste o nosso arraial;
salva sempre os Leoneses,
e a gente de Portugal.»


Escavações Poéticas; 1844

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