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segunda-feira, 28 de abril de 2008

Políbio Gomes dos Santos

Génesis

O mundo existe desde que eu fui nado.

Tudo o mais é um... era uma vez

- A história que se contou.

No princípio criou-se o leite que mamei

E eu vi que era bom e chorei

Quando a fonte materna secou.

A terra era sem forma

E vazia;

Havia trevas no abismo.

E formou-se o chão

E amassou-se o pão

Que eu comi.

(Era este auela esponja que eu mordia,

Que eu babava,

Que eu sujava,

Que uma gente andrajosa pedia).

E então se fez

a geração remota dos papões:

Nascera a esmola, o medo, a prece

E o rosto que empalidece...

E a rosa criou-se,

Desejada,

E logo o espinho,

A lágrima,

O sangue.

Este era vermelho e doce,

A lágrima doce, brilhante, salgada;

No espinho havia o gosto

Da vingança perfumada.

E eu vi que tudo era bom.

E fizeram-se os luminares

Porque eu tinha olhos,

E o som gez-se de cantares

E de gemidos, Porque eu tinha ouvidos.

Nasceram as águas

E os peixes das águas

E alguns seres viventes da terra

E as aves dos céus.

O homem que então era vagamente feito,

Dominou o homem, comprimiu-lhe o peito,

E fizeram-se as mágoas

E o adeus.

E eu vi que tudo era bom.

A mulher só mais tarde se fez:

Foi duma vez

Em que eu e ela nos somámos

e ficámos três.

Nisto e no mais se gastaram

Sete longuíssimos dias.

O mundo era feito

E embora por tudo e por nada imperfeito,

Eu vi que era bom.

Acaba o mundo

Quando eu morrer.

Sim... será o fim!:

Também tu deixas de existir,

No mesmo dia.

E o resto que se seguir

É profecia.

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