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sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Eduardo Pitta

 

Inapelavelmente próximo
descubro-lhe no linho
os olhos calcinados.

Nenhuma água
para tanta cinza.

Vejo-os chegar à velocidade
da erva
inquietos mais que desolados.

Vêm mudos, sujos
muitas vezes, periféricos
a qualquer melancolia.

O campo, a cidade
e mesmo as gentes
lhes são estrangeiras.

Poucos nos embaraçam já
mas uns quantos cintilam na névoa
da beira-rio,
o basalto a quebrar-lhes
os quadris.

Transportam-se com a lentidão
de felinos.

Na ganga coçada dissimulam
pouco, e mal, o lume
das coxas.

Descem à tribo amotinada
que os surpreende
tesudos.

A história deles pode ter sido,
por vontade alheia,
a simulação excessiva
e luminosa
de outra culpa maior.
Ainda que Inês fosse um chavalo

Pedro não andaria ali à toa
e a legenda dos algozes trucidados quadra
de viés numa corte predadora.
Importa pouco a conexão
estrangeira, as dezassete léguas
de um cortejo

siderante como aqueloutro que à luz
de seiscentas arrobas de cera
para sempre mediatizou
D. João Afonso Telo, miminho
da cantareira de el-rei.
A boca à mercê de novas dominações.

Temos sido espectadores
de um tempo rarefeito.

Tudo nos inibe
e tolhe o passo.

E mesmo somos o intruso
na querela.

Anna Soror e Wolfgang Peterson
comeram à nossa mesa.

D. Miguel não veio
a tempo,
distraiu-se com a passarada
de Mount Desert.

Ali estivemos, contando-nos.
Recordações do Village,
do barco para Pines.

Divine madness: num lapso
de febre
a lâmpada devolve-nos
o rosto glabro do castelhano

Fonte: Site Eduardo Pitta - Poemas

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