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sexta-feira, 27 de março de 2009

António Botto

 

No Tejo

Depois da faina, o navio -

Já lá vai pelo mar fora!

A faina foi dura e a carga

Foi tanta que o alcatrate

Quase que ficou rez-vez;

Tinham que olhar com cuidado

Aonde se punha os pés!

Mas tudo se fez e em bem!

O peor foi a noite perdida

Sempre a mexer e a trabalhar

Para o navio largar

Ao romper da madrugada!

Noite fria de Novembro

Em que as estrelas tristes lá no céu

Pareciam distantes e perdidas

De tudo a que elas dão amparo e guia!

Parecia que a noite era infinita

Que não deixava

Nascer o dia!

Ninguém dormiu. O camarada,

O arrais, o moço - e ao porão,

Uma contra-mestre aloirado,

Tipo nórdico a fumar,

Continuamente, cachimbo,

Ia dizendo a uns dois

Que arrumassem com cuidado

A carga que ia descendo...

O barulho dos guindastes

Raspava na pele impulsos

Que davam tosse e mau-estar

E como de um gigante que dormisse

Ouvia-se a respiração do mar!

Mas com a luz do Sol, oiro e alegria!

Passam, agora, lentos e lavados

- Só a vela de estaia vai erguida!

Os barcos com os mastros levantados

A caminho das docas onde ficam

À espera de outras safaras iguais!

Uma mulher dá de mamar ao filho

Ali sentada a um canto sobre o cais!

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