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sábado, 4 de abril de 2009

António Cabral

O Sonho que nos legaram

Douro dos montes em calvário
e dos passos vertiginosos,
ouve-me:
assim não havemos de morrer.
Estenderemos o sonho que nos legaram
os que morreram antes de nós;
estenderemos esse manto azul
e, um dia, sabemos
que é nossa a terra da promissão.
Bela é a flor do pessegueiro:
ela germina dentro de nós.

Que aconteceu ao homem sem esperança?
Uma serpente lhe entrou nos olhos
e não deixou mais que um lugar vazio.
Nós seguiremos pelo deserto
das horas fundas e turvas,
até à colina que está no fim
do nosso  desejo.
Um dia bate alguém à nossa porta
e diz:
« vê este regaço cheio de papoilas:
os campos estão limpos. Cantam
livremente a cigarra e a cotovia. »
Essa é a hora.
Então
desceremos a escada de todas as mágoas,
e o sonho que nos legaram
dará o seu fruto,
dará
mesmo que seja a última colheita.


in Poemas Durienses

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